Duns Escoto: Definição de vontade e natureza. #Filosofia

in #pt5 years ago

Não sou muito fã dos pensadores medievais e muito menos da metafísica, mas como tudo neste mundo há exceções, hoje vou trazer um texto que escrevi há algum tempo sobre Duns Escoto, autor que mesmo definindo deus como “causa primeira” foge um pouco do que era comum no seu tempo.
 
Esta é uma resenha crítica do texto – Questões sobre a Metafísica IX, q. 15 – a referência bibliográfica se encontra no fim deste texto.




 
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Duns Escoto inicia com uma explanação acerca de potência racional e irracional aristotélica que para ele se distinguem de tal forma:
 

  1. Potência irracional: capaz de produzir apenas uma causa, como por exemplo o fogo, capaz de produzir apenas o calor e não o frio.
  2. Potência racional: capaz de produzir atos opostos, por exemplo o intelecto, pois quando produzimos um ato de conhecimento sobre algo, produzimos também acerca de seu oposto, saúde e doença, vida e morte.

 
Escoto ainda distingue a potência racional em duas partes, “ou ela é por si mesma determinada a agir e por si mesma não pode não agir; ou ela não é por si mesma determinada a agir, podendo por si mesma agir ou não agir”.
 

  1. “ou ela é por si mesma determinada a agir e por si mesma não pode não agir”: neste caso a potência deixa de produzir seu ato por fatores externos, que a impedem de agir, ela será determinada a um dos opostos. Escoto denominou como “natureza”.
  2. “ou ela não é por si mesma determinada a agir, podendo por si mesma agir ou não agir”: aqui ela pode produzir ou não seu ato independente de fatores externos já que “ela pode agir por si mesma”. Escoto denominou como “vontade”.

 
Para o autor não faz sentido buscar ou questionar as causas na “natureza” e da “vontade”, a natureza age de determinado modo e não de outro, já a vontade age da forma que quer e só, se fosse determinada por alguma causa já não seria mais vontade.
 
Apresenta dois argumentos para dizer que existe a vontade livre, o primeiro é que se todas as causas fossem determinadas e não houvessem causas indeterminadas todos os efeitos seriam necessários, desta forma, tudo seria “natureza” e não mais vontade, em segundo, o ato de querer é contingente, ou seja, eu posso querer algo, mas também posso deixar de querer algo pelo seu oposto, ou querer o seu oposto, não que tenhamos consciência de todos os motivos, mas contingencialmente posso querer seu oposto.
 
Além disto, ele não postula a “liberdade da vontade”, pois desta forma negaríamos a responsabilidade, não que tenhamos uma experiência de responsabilidade para provar a liberdade da vontade, mas temos experiência desta liberdade.
 
Escoto diz que há dois tipos de indeterminação da vontade, indeterminação por falta de atualidade e a indeterminação por abundância:
 

  1. “atualidade”: a matéria não pode ser causa de um ato que não está presente nela, ou seja, a matéria pode receber qualquer forma, mas é incapaz de se determinar a qualquer forma.
  2. “abundância”: neste caso a matéria possui atualidade ilimitada, ou seja, não é limitada a um ato ou a um conjunto deles. O autor usa deus como exemplo, diz que nele não falta atualidade e todos os atos estão contidos nele, portanto tal indeterminação não ocorre por incapacidade de causar um ato, mas por superabundância.

 
A indeterminação da vontade não é uma limitação causada por uma imperfeição de falta de atualidade, mas sim causada por, segundo o autor, existir um ser perfeito com atualidades ilimitadas.
 
Portanto a vontade é mais perfeita que a natureza, o sol por exemplo, mesmo que ele consiga solidificar o barro, ele faz isso de forma determinada e limitada, e segundo o autor não se pode negar a perfeição por ela não existir em seres imperfeitos.
 
Para o autor o intelecto é uma potência natural, pois funciona de forma determinada, não podendo, por exemplo, negar algo que é evidente, mesmo produzindo conhecimentos opostos, saúde e doença, ele o faz de forma determinada. O intelecto não é por si só uma potência racional, pois não é capaz de produzir atos opostos, potência racional, apenas a vontade, pois apenas ela é capaz de produzir seus atos opostos.
 
Mas o ato do intelecto não é determinante para a vontade, apenas mostra para a vontade o que é melhor, portanto um ato da vontade necessita de um ato do intelecto.
 
Particularmente, concordo com vários pontos explanados pelo autor acerca da vontade e da natureza, portanto não explanarei sobre pois apenas diria mais do mesmo. Deste texto, não concordo com a indeterminação por abundância, isto me lembra muito Descartes quando diz que o imperfeito pode pensar no perfeito.
 
Discordo absolutamente disto, pois se o nosso intelecto é imperfeito e limitado não podemos extrapolar isto, seria a mesma coisa de um ser humano querer voar igual a um pássaro, batendo os braços no caso, é impossível e inimaginável.
 
Portanto a indeterminação por abundância poderia ocorrer caso algum dia exista um ser humano com intelecto superior a outros, ou um supercomputador com cálculos ilimitados (claro que o autor não poderia imaginar isto).
 
Ao meu modo de ver, isto não pode ser pensado sobre um ser de dúbia existência, pois não se sabe ao certo se é perfeito ou imperfeito, na verdade nem se sabe se existe ou não existe.
 
Por fim o conceito de indeterminação por abundância é vago e não possui proposições passíveis de qualificá-lo, mas entendo que naquela época o autor possa ter sido condicionado a pensar desta forma, ou seja, em um deus, já que até nos dias de hoje a sociedade nos obriga e nos condiciona a crer em algo transcendente ao mundo real.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
CEZAR, Cesar Ribas. Scotus e a Liberdade: textos escolhidos sobre a vontade, a felicidade e a lei natural. São Paulo: Loyola, 2010 p.13-19


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Valeu, @antigourmet! Desta vez me pegaste, se me perguntassem sobre Duns Escroto iria achar que estavam falando de uma banda de punk rock :D Aprendi mais um pouco, obrigado por compartilhar ;)

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Kkk, normal @casagrande vários pensadores sāo desconhecidos da maioria das pessoas, vou tentar trazer mais deles para o Steemit.
Obrigado por ler e comentar.

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Questões muito interessantes e profundas. Demasiado profundas para um comentário breve por aqui... gostei bastante e fiquei interessada por este pensador que não conhecia. Obrigada por dar a conhecer.

ptgram

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Excelente @isabelpereira, muitos dos seus textos são fáceis de achar na internet, a grande maioria é de domínio público.
Obrigado por ler e comentar.

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Aulas e mais Aulas para nos enriquecer!


ptgram

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Essa é a minha função...rsrs
Obrigado por ler e comentar.

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