Agradecendo a uma vida de aprendizado e oportunidades, e o retorno pelo aprendizado. Ainda há muito a aprender.

in #pt6 years ago (edited)

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Imagem autoral - Aproveitando a parte boa do Rio para aprender em 2017

Em 02/06/1989 em uma cidade de interior, eu nasci, nas mão do meu tio,um grande obstetra que Deus o tenha, em uma família que saia de uma classe social baixa e se estabilizava, em um Brasil de inflações imensas, e que a poupança era investimento de alto risco, no entanto, que já em meu nascimento tinham emprego e suas residências próprias.

Acredito que já nasci em um “berço de ouro”. Meu Pai funcionário público, já era e continua sendo professor federal e também complementava como técnico de eletrônica na época, minha Mãe assistente social em uma creche filantrópica para população de baixa renda, financiada pela instituição Lions na época.

E acompanhei e gosto de estudar a história do Brasil , correlacionando ao que vivi de 1989 até hoje 2018, com problemas políticos, econômicos e sociais.

Cada um vai aprender de acordo com sua realidade, e tive muito que muitos não tiveram oportunidade, ao mesmo tempo conheci realidades diferentes.

E em comparação com hoje, pelo menos a meu ver, noto o quanto evoluímos de modo geral como sociedade, apesar de muitos não terem a mesma impressão. E hoje compartilharei um pouco da minha trajetória aqui com a comunidade no steemit.

Em 29 anos de idade, conheci muita coisa, ainda que jovem, e tendo muito a aprender. Sou abençoado, desde que nasci, em referências familiares, em afeto, em direitos, em renda, em sorte, e nas oportunidades.

Assim como aprendi com meus pais, estudar era prioridade, minha mãe fez psicologia durante minha infância e passou em concurso público municipal, meu pai trabalhava em uma empresa estatal como técnico que foi privatizada, foi recontratado e continuou sua carreira acadêmica, fez engenharia, pós graduação, mestrado, e hoje está fazendo doutorado com 56 anos.

Também aprendi que trabalhar era importante, meu pai trabalhava no 8 horas diárias na empresa, e a noite dava aula das 18 às 21 horas. Minha mãe às 8 horas diárias na creche, e 24 horas em casa de plantão, para cuidar da minha irmã e de mim.

Todo ano minha mãe fazia eventos de caridade, com arrecadação e doação de alimentação, brinquedos para as crianças da creche, do qual eu frequentava também quando não tinha ninguém para ficar comigo.

Ou ficava na rua soltando pipa, jogando futebol com gol fechado, demarcado com paralelepipedo ou chinelo, no proprio paralelepipedo que frequentimente deixava a ponta do dedo com uma topada, jogando baleba e rivalizando com o pessoal da outra rua.

E mesmo assim estudar nunca foi fácil, o ensino público vinha se definhando em qualidade, fizeram que meus pais que estudaram em escola pública me matricular em uma escola particular, em uma das mais conceituadas escolas da época, e que consumia grande parte da renda familiar, as salas com 40 alunos, e poucos professores faziam chegar o conteúdos aos alunos, estudar sempre foi obrigação, nunca prazer.

Mesmo assim tinha que passar nas provas, e a técnica era estudar na noite anterior ao dia das provas, na maioria das vezes dava certo. Nunca fui o melhor aluno, mas também não reprovei nenhum ano.

Comecei a mexer com computador novo, uma configuração com 40mb de hd, 4 MB de memória ram, e windows 95. Instalava todos os CD-ROM que vinham nas revistas, e conheci a internet discada, com provedor UOL e IG, e salas de bate papo do UOL, e depois o Mirc.

Mesmo assim, não gostava muito de conversar na internet, e usava pouco, na época não fazia sentido, já tinha meus amigos na rua e escola, e poucos gostavam também, mas jogar sempre me prendeu horas no computador, com elifoot, the sims, simcity, age of empires, dark colony, counter strike e milhares de jogos, que mantenho o hábito até hoje.

Com 17 anos passei no vestibular para faculdade de medicina particular, medicina na escola pública era muito difícil passar, de quem fazia cursinho ninguém passou, e passar para medicina já era uma vitória.

O que fazia meus pais pagarem ainda mais da renda familiar a minha escolaridade. De certa forma ficava incomodado, não trabalhava, e a faculdade era integral, gastava minha mesada com xerox, e a noite tinha que estudar.

E aprendi que minha técnica de estudo não funcionava mais, tive que aprender a estudar, e mesmo que continuasse o modelo de ensino, com 90 alunos em sala, não podia decepcionar minha família que investia caro em minha escolaridade.

Comecei a trabalhar com 18 anos, não precisando mais de mesada, e com 23 anos formei, e desde então conquistei minha independência financeira.

Nesse período outra sorte, ou destino, encontrei a mulher da minha vida, com quem me encontro casado.

Meu pensamento era, que precisava de independência financeira, tenho muita coisa que queria comprar e não podia, e aos 24 anos aprendi que quanto mais dinheiro, maior é o gasto.

A vida de médico encontra a facilidade financeiro, é a lei da oferta e demanda que molda nossa cultura, o que na prática vem com muitos vieses.

Tomei calote de municípios, atrasos de salários de 3,4 meses, e é normal isso, vida de plantão, dava 5, 6 plantões por semana. E algo que nunca nos ensinam, e até hoje não aprendi, a me acostumar com a morte.
Fiz cardiologia,e trabalhava com terapia intensiva, nas UTI’s, é uma área da medicina incrível, onde você vê pessoas praticamente renascendo, e outras morrendo de uma hora para outra.

É o médico que assina o atestado de óbito, e comunica cada família. Lida-se com a morte todos os dias, independente da vida que a pessoa leva, a cobrança é que ela não morra, já que é uma referência para alguém dentro do seu ciclo familiar.

E o objetivo é que as pessoas não morram, era a minha função, aquele barulho de aparelho desconectado fazia parte do dia a dia, e quando de cara com a saúde, vida e morte, aprende-se que dinheiro não vale nada, e que sem ele não vivemos também.

Certamente o dinheiro não vale o plano de saúde que você paga, que não autoriza muitos procedimentos, ou medicações, mesmo preenchendo vários papeis enquanto o doente esta ali precisando, e mesmo assim fazemos muito sem autorização, o que gerava um custo ao hospital que o plano não pagava.

Aprendi que quem tem dinheiro no Brasil, e acredita que pode pagar particular sem plano viver um sonho, pois está tudo bem até não está mais, e pode ocorrer um mal súbito em qualquer idade, uma diária de UTI no interior custa no mínimo 2.000 reais, fora visita médica, equipe, material, oxigênio, sangue, parecer médico, me assustava as contas de 200, 300 mil reais no mínimo.

Aprendi como é ruim ver pessoas morrem o tempo todo, sabendo que existe recursos tecnológicos, e medicações que não temos acesso, seja no público, ou no particular normal, que é o que a classe média acredita que é igual ao da classe alta.

Aprendi também a me perguntar qual o valor de uma vida, qual o valor de uma vida? Da sua vida? De quem você ama?

Não tenho uma resposta também, mas ela tem valor, a todo momento, desde o nascimento, até a morte.

Nesses questionamentos, resolvi estudar saúde mental, na área de Psiquiatria, retornando estudar para como se fosse um vestibular, e fazer provas em busca de uma vaga, se especializar no Brasil não é fácil.

E junto a minha alma gêmea, sai do interior rumo a capital com 27 anos, para trabalhar e me especializar no SUS do município do Rio de Janeiro.

Aqui aprendi também, aprendi a pensar, a ver que somos pobres brigando pelo osso, a miséria reina em uma população desassistida pelo poder político.

Trabalhamos no limite de medicação e assistência, em meio a guerras civis, com atraso de salário, demissões de funcionários, redução dos serviços, todos os dias são notícias ruins, e de mais restrições de direitos constitucionais, como saúde, segurança, acesso, alimentação.

Aprendi que o que sustenta o serviço público, são os servidores públicos, a parte técnica do trabalho e não a parte política, parte essa que é tomada pelas generalizações de grande parte da população.

Aprendi que a população brasileira de classe média e baixa não tem acesso a uma saúde de direito, só aos resquícios de uma falsa impressão de saúde dos planos de saúde, e um plano muito melhor que é o SUS vem sendo sucateado para pagar dívidas públicas e um Estado inflado e gorduroso, onde 10% do PIB vai para saúde e 10% para educação.

E 80% para dívidas externas, para os políticos, o jurídico, e que no INSS meu pai que é servidor público, não recebe nem a vigésima parte do que um juiz ganha, ou um político, ou um político que ficou um dia na presidência, ou no governo estadual, ou um coronel, ou um desembargador.

Aprendi que para ter saúde no Brasil, você tem que ter pelo menos 1 milhão de reais guardado, é um salvo conduto, claro que não irá pagar as contas dos Einstein ou Sírio Libanês em casos que demandam de um tempo maior de UTI.

Aprendi a futilidade de discutir esquerda e direita, política, e organização social, em um país que como o falecido Tim Maia trazia, que era um país que pobre era e é de direita, e que a maioria da população acredita que ser rico é ganhar 10 mil por mês.

Aprendi que viver a utopia das discussões de modelos organizacionais sociais em redes sociais, e não fazer nada na prática, é sustentar o que os políticos fazem, falam, falam, brigam, ofendem, e no final continua tudo na mesma, vivem a covardia da mudança, de se satisfazer por acreditar no determinismo e que nada mais vale, e que se muda com ato, igual quando um coração para, se você ficar olhando, ele nao vai voltar a bater, se você ficar pensando, fosforilando, debatendo, ele vai continuar parado, e cada segundo é um segundo próximo da morte, que o oxigênio não chega ao cérebro, a nenhum órgão, se você intervir ele pode voltar a bater, a maioria não volta, mas os que voltam, quando saem andando da UTI, valem por todos.

Como disse aprendo todos os dias, aprendia estudar, a entender como funciona o nosso modelo social, como interagir com ele, como ajudar as pessoas, como ganhar 80 reais de bolsa família faz diferença para os que precisam, por mais que muitos justifiquem pelos que não precisam, não tendo ciência de quem mora na mesma rua, no seu bairro, imagina nesse país imenso.

E hoje sou agradecido, por ter a oportunidade de aprender, ter condições, acesso, renda, familiar, de ter uma família que se sustentou e sustenta do serviço público, e que faz seu retorno com impostos, e trabalho técnico.

O Brasil vive um classicismo, que descentralizou desde sua colonização, e que vem se descentralizando aos passos de lesma, e que ainda se remonta ao modelo feudal.

Aprendi entender isso, e que irei viver nesse tempo, sem grandes mudanças, mesmo que acredite que a tecnologia blockchain seja uma grande esperança para descentralizar o Estado.

Aprendi a ser o mosquito do história do incêndio na floresta, a fazer minha parte, a não mudar o mundo, e sim ajudar as pessoas que precisam do meu ofício.

Aprendi que a saúde não se faz com hospital, e sim com prevenção, e que o médico é igual remédio, é para remediar, e tem sim efeito colateral, quem cuida da sua saúde e você.

Poderia escrever o dia inteiro o que aprendi, e que não são conceitos fixos, como diz Raul Seixas, sou uma metamorfose ambulante.

Aprendi a agradecer, aos serviços públicos, não aos serviço ou Estado em si, aos funcionários, as pessoas que estudaram para estar ali, que dispõe de sua vida, de suas famílias, em função de servir ao Estado, servir a nós, porque nós somos o Estado, os servidores e a população são o Estado, e os servidores só são reconhecidos pelas exceções da imprensa sensacionalista.

Somos os cavalos da Revolução dos Bichos de George Orwell e a resistência em prol da assistência, trabalhando em combate a uma população que sofre a má administração pública, e sofre a falta de referência de suas criações, de acesso, de oportunidade, enquanto a alta classe goza de um outro Brasil, o de direito, enquanto servimos com os deveres.

É em combate, pois é uma luta praticamente sem apoio, só reclamação, posts em redes socais, discussões de direitos, e que nada funciona. Uma luta que deveria ser unidade, mas não é, ossos do oficio, continuaremos nessa guerra de insurgência.

E assim faço 29 anos, crescendo, e aprendendo a cada dia, com muitos ideais, muitas responsabilidades, direitos, deveres e com muito entusiasmo, para continuar servindo, produzindo em minha prática clínica, teórica e científica, cuidando da minha família, dos meus pacientes, querendo um dia ter minhas crias, e ensiná-las como aprendi, e continuarei aprendendo, que o mundo não é nosso, fazemos parte dele, que cada um é responsável pelo que escolhe e faz, decorrente da sua construção psíquica, e que não me cabe questionar o cada um, porém posso refletir aqui, e passar aos meus como Jung nos ensinou, diante de uma alma humana, somos apenas outra alma humana, cheia de defeitos e qualidades, como todos são, e que isso não é um defeito, e sim a nobreza do que nos diferencia dos outros animais, em nossa forma de linguagem, os defeitos que nos tornam humanos, e capazes de moldar o afeto.

Aprendi e usarei uma metáfora que vi em um seriado, que o pensamento funciona mais ou menos assim, podemos pensar que o mundo é preto e branco, ou aprendemos que existem escalas de cinza até chegar o preto, e também uma escala de muitas cores, das mais diversas possíveis, e podemos ver a escala como um todo, ou não, vai depender de cada um.

E aqui estou no steemit, também produzindo e conhecendo a descentralização, sonhando os ideais que isso pode nos trazer! Obrigado pela leitura, espero e planejo estar aqui nos 30 também!


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Rapaz, no auge dos seus 29 anos você aprendeu muita coisa.
É isso o que acontece quando a pessoa está disposta a aprender.
Gosto das suas críticas políticas e sociais

Vivendo e aprendendo amigo @belzunces! A vida não é fácil para ninguém, para uns mais difíceis do que para outros, mas podemos aprender a todo momento, e nos ajudar, assim formam-se comunidades fortes! Seja no mundo real, ou virtual! Obrigado pelo comentário.

Parabéns, seu post foi selecionado pelo projeto Brazilian Power, cuja meta é incentivar a criação de mais conteúdo de qualidade, conectando a comunidade brasileira e melhorando as recompensas no Steemit. Obrigado!

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Matheus, sem palavras pra esse post, quase um relato biográfico em si. Sensacional, profundo, sensível e inteligente... me arrisco com algumas definições... Obrigado pelo relato e por ser esse brasileiro, consciente e iluminado. Se investíssimos em educação como se deve, teríamos mais Matheus, Marias e Josés como vc, mas a realidade é outra... no mundo e, em especial, na terra tupiniquim. Um caloroso abraço.

Valeu @raskolhnikov! Uma realidade difícil mesmo, mas é isso, acredito que não houve no passado mais fácil em termos gerais, e vamos seguindo, a terra tupiniquim ainda tem muito a produzir, talvez a tecnologia nos de uma melhor direção, e consigamos controlar o fator humano que e investir no mais rentável investimento que uma nação pode ter, a educação, investir no capital humano. Muito obrigado pelo comentário!

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